Quando
comecei a estudar a disciplina Literatura Africana, ainda na faculdade de
Letras, não imaginava que ficaria tão encantada com todo material literário que
vem sendo produzido na África. Nesse período, conheci a obra do escritor
moçambicano Mia Couto e, desde então, sou sempre fisgada por tudo que ele
escreve. Com seus livros descobri Moçambique, a África e o
mundo. Marejei os olhos, sorri e me debrucei em encantamentos e
elogios a tudo que ele escreve. No último sábado, em Olinda, durante o evento
da Fliporto – Feira Literária de Pernambuco, junto com outro autor africano de
quem sou muito admiradora, José Eduardo Agualusa, tive a alegria de poder
conversar com ambos após uma riquíssima palestra em que eles foram destaques.
Impossível de não bancar a tiete e pedir autógrafos em livros, fotos... Impossível
não dividir com todos a minha volta esse autor que há anos me encanta.
SAUDADE
Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura
sói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés
Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas
Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta
Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono
ferindo-se de ternura
sói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés
Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas
Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta
Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono
Mia Couto, nascido António Emílio Leite
Couto (Beira, 5
de Julho de 1955), é um biólogo e escritor
moçambicano. Filho de portugueses que emigraram para Moçambique em meados do século
XX, Mia nasceu e foi
escolarizado na Beira. Com catorze anos de idade, teve alguns poemas publicados
no jornal Notícias da Beira e três anos depois, em 1971,
mudou-se para a cidade capital de Lourenço Marques (agora Maputo). Iniciou os estudos universitários em medicina, mas abandonou esta área no princípio
do terceiro ano, passando a exercer a profissão de jornalista depois do 25 de Abril de
1974. Trabalhou na Tribuna até à destruição das suas
instalações em Setembro de 1975, por colonos que se opunham à independência.
Foi nomeado diretor da Agência de
Informação de Moçambique (AIM) e formou ligações de correspondentes entre as províncias
moçambicanas durante o tempo da guerra de libertação. A seguir trabalhou como
diretor da revista Tempo até 1981 e continuou a carreira no
jornal Notícias até 1985. Em 1983, publicou o seu primeiro livro de
poesia, Raiz de Orvalho, que inclui poemas contra a propaganda marxista militante. Dois anos depois,
demitiu-se da posição de diretor para continuar os estudos universitários na
área de biologia.
Além de considerado um dos escritores mais
importantes de Moçambique, é o escritor moçambicano mais traduzido. Em muitas
das suas obras, Mia Couto tenta recriar a língua portuguesa com uma influência
moçambicana, utilizando o léxico de várias regiões do país e produzindo um novo
modelo de narrativa africana. Terra Sonâmbula, o seu
primeiro romance, publicado em
1992, ganhou o Prémio Nacional de Ficção da Associação dos Escritores
Moçambicanos em 1995 e foi considerado um dos doze melhores livros africanos do
século XX por um júri criado pela Feira do Livro do Zimbabué.
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